terça-feira, 26 de janeiro de 2010

Semanalmente

     A tarde se despede com cheiro de saudade. Na boca fica o gosto amargo da despedida. De quem foi sem ter ido. Presença a recordar ausência. E o peso da dúvida insiste em desvendar um adeus que não convenceu. Eram meros desejos de domingo?
     Nenhum verso mais vale a pena ser escrito, nem minhas segundas intenções reveladas. É tarde...
     Teça melhores desculpas para a próxima terça que quarta eu já não te espero mais .
     A semana segue sua sina de passar lentamente e nem mais a quinta sinfonia me refaz a melodia. Ando sem cor, sem tom, sem letra. Até os talheres se cansaram de esperar pela siesta e o jazz de avisar que não passa no próximo sábado.
     O calendário entendiou-se da precisão das datas e o relógio desistiu de marcar o compasso das horas.
     Na minha agenda sobrou um recado do último dia. Uma frase tímida, ao lado da lista de compras. Sem rimas, sem poesia, com seu estilo próprio de poucas palavras. “Ninguém parte sem a pretensão de voltar...”

quarta-feira, 6 de janeiro de 2010

Em outra estação

     As tardes são mais tristes que as manhãs. Os deprimidos sabem disso. O dia cumpre a sina de se descolorir lentamente enquanto os primeiros retalhos de sombra caem sobre a terra e o céu se diverte brincando de fazer aquarela.
     Caminho pela cidade calma sem pressa de voltar ao ofício de ser triste. Os carros poluem o ambiente enquanto eu despoluo a mente. As pessoas se trancam em casa para sacramentar a rotina sem surpresas enquanto eu teimo em me acidentar no amor que me desconcerta o tempo todo.
     As cores do dia já começam a desbotar, assim como o que sobrou do último vinho, do perfume do derradeiro abraço, da música que não chegou ao fim...
     Partir é também uma forma de esquecer o coração partido em palavras que nunca foram ditas e de devolver-me ao que sobrou de mim. O que resta agora é apenas uma saudade aflita com um bilhete de viagem na mão e um ramalhete de gestos na outra.
     Melhor assim. Talvez meu coração decida de vez embarcar numa estação distante, com destino às melhores manhãs que eu ainda tenho o direito de viver. Nem que seja só para ter o prazer de dizer que vou ser bem mais feliz que você. Ah, se vou!

[Este texto tem inspirações na música intitulada "Naquela Estação". Uma composição de Caetano Veloso, João Donato e Ronaldo Bastos. Sugiro a gravação memorável de Adriana Calcanhoto]