domingo, 17 de junho de 2012

Ambiguidades

Quem bate mais na porta: quem parte ou quem retorna?
Quanto choro é preciso para sustentar a identidade de um único riso?
Quantos sulcos no rosto são necessários para manter a juventude da alma?
De quantas perdas a vitória se faz?
Quanta dúvida existe por trás de uma convicção bem fundamentada?
Quem que no certo procurou, mas se perdeu depois?
Quem nunca se descobriu no ódio amando às avessas?
A luz esconde as sombras?
O muito não seria apenas o pouco multiplicado?
E a saudade faz a alegria entristecer?

[A autora no momento mais interrogativo, investigativo e pueril da sua vida]

sexta-feira, 8 de junho de 2012

A origem das enfermidades


A maioria das doenças nasce da palavra.
Ou melhor, da ausência dela dita na hora certa.
Mesmo inapropriada, diga.
Até no superlativo, diga.
Pronuncie agora em alto e bom tom um palavrão.
O silêncio dói mais que faca penetrando no peito.
Está escrito: nível A de comprovação.
A vivência ensina que a bactéria mais nociva
pode vir acompanhada da palavra “querida”.
Palavra que não saí é raiva que calcifica.
Se não sai é tarefa sua acertar depois as contas
com a litíase e a prisão de ventre.
Nem adianta ter plano de saúde.
Um dia a conta vem.
Quanto mais visceral, mais imune se é.
Cólica por cólica, prefiro a dor do parto.
Dessa consciência que o poema me traz. 

[A autora pensando como o poema consegue ser o melhor Tratado de Medicina Interna que a humanidade já inventou]

sábado, 2 de junho de 2012

Dois metros e meio de grito


No quesito quantificações,
o amor é das medidas o substrato mais sem consenso.
Incompletas considerações,
aritmética de prejuízos e sustos,
ambíguas voltas sem reembolso de custos.
Chatos cálculos, mas é preciso fazê-los.

A ponta pontiaguda do lápis sempre sacrifica,
ao final das contas, o já endividado bolso do peito.
Se sorte no jogo traz de brinde azar no amor,
de que me vale sorte no amor
se o amor é um jogo
e o jogo não é meu ponto forte?
Responda, se for capaz,
meu amor?



[A autora brincando de Paulo Leminski numa manhã, quase tarde, repleta de cinismo]