Comemoro
hoje meu vigésimo sétimo aniversário. Ou seria meu quadragésimo? Tudo depende
de quanto tempo deixei de viver nos últimos anos. O que posso afirmar
sinceramente é que a minha idade nunca combinou comigo. Acho até que já nasci com
certidão de velhice e que minha alma veio lá dos anos 70 (Sabe, uma espécie de "Velha e Louca" como diz uma doce canção por
aí?!).
Escolhi a roupa, tomei banho, sequei o cabelo e retoquei as
olheiras. Acho até que essas nem Deus consegue mais dar jeito. Separei também
para usar aquele colar com conchas que o mar da saudade um dia me trouxe.
Começo o dia respondendo com voz firme ao chamado da vida: “Presente. Cá estou!”
Encaro-me no espelho do banheiro enquanto escovo os dentes e
percebo que já amanheci tarde. Tento descobrir no que me tornei após tantos
percursos acidentais, tantos deslizes, tantos esquecimentos, tantos afetos,
tantos amores. Alma encharcada, repleta de chão, desistência completa de
qualquer ideia conformada de me adiar mais uma vez. A vida é assim mesmo tão
urgente ou sou eu que ando perdida em suas reticentes vírgulas? Suspiro fundo,
pensativa e calada, ao invés de responder.
Quero um dia de interjeição. Dizer um sonoro e convicto “alto lá”
ao diploma do fracasso e ao chute no traseiro. Quero a arquitetura inventiva de
dias que ainda não aconteceram, mas gelam as minhas mãos, trêmulas como de uma
criança, de tanta emoção incontida.
Sopro as velinhas do bolo imaginário que eu mesma preparei usando
como ingredientes as insatisfações que acumulei ao longo do meu caminho. Cara
feia agora é doce de leite e o fracasso, a cerejinha de enfeite final. A
receita da vida, às vezes, requer um recheio de dúvidas inconvenientes e um
sabor agridoce de cinismo. Antes de sair de casa, tomei café sentada ali,
sozinha, na minha gelada cozinha. Depois caí na gargalhada pensando na meia
dúzia de planos que eu havia projetado para concluir antes dos 30 anos. A vida
me ensinou a duras penas a desengavetar a poesia, mesmo que ela continue sendo
incorrigivelmente tímida e triste. Quem mandou Drummond aparecer na minha vida
aos 13 anos.
Descobri, nessa altura da vida, que ironizar-se é o melhor presente que alguém pode dar a si mesmo. Decidi, finalmente, acatar o conselho insistente e sábio daquele anjo torto que vive na sombra mansa desse vasto mundo a me dizer:
-Vai, Patrícia, ser gauche na vida!
E agora, com licença, que eu vou ali errar um pouco mais.
P.S.:
Descobrir que você nasceu no mesmo dia em que foi instituído o horário de
verão no Brasil pode dizer muito da sua própria personalidade. Talvez isso
justifique, em grande parte, a minha inadequação com as horas e a constante
predileção por esse jeito de fim de tarde que a vida tem. Para encerrar, a
trilha sonora escolhida para hoje...
Entregue-se- Tiê
Velha e Louca- Mallu Magalhães
Eu quero ser feliz agora- Oswaldo Montenegro
Deus me proteja- Chico César
O vencedor- Los Hermanos
“Aniversário
é uma festa para te lembrar do que resta”
Millôr Fernandes
Um comentário:
Que massa o texto, e bela seleção de canções ao final! =)
Parabéns poetiza, cronista, mulher, amiga, enfim, tantas! Tantas pra ainda ser... beijo!
Postar um comentário