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segunda-feira, 12 de outubro de 2009

Porta de entrada

     A casa é sempre uma metáfora apropriada da vida. Lugar onde o coração não carece de muitas explicações, apenas repousa sereno no lugar de sua identificação. Dentre todos os espaços, a cozinha é certamente o mais poético deles. Quem nasce em Minas Gerais aprende esses mistérios desde cedo.
     Cozinha é o lugar da intimidade, de acolher os mais amigos, das conversas segredadas, das fofocas sem malícia (risos...). Ali, a vida vira prato cheio para quem se empenha em desvendar os sabores velados próprios de um cotidiano sem grandes requintes. Sabores simples e, ao mesmo tempo, essenciais.
     Cozinha também é território de vaidades. Lugar onde se arranca elogios apelando-se para o ponto fraco da maioria. Poetas são cozinheiros, seres vaidosos, que gostam de se exibir cruamente nas prateleiras das livrarias expondo o que é nosso e nem sabíamos possuir. Retiram-nos do anonimato, garbosos por nos envolver em seu jogo de sedução. Obra dos temperos. Das palavras também.
    A cozinha também foi feita para a calma. Receitas são exigentes tanto quanto poemas. Precisam de tempo e dedicação para adquirirem sabor.
     Assim, a vida cumpre à risca suas regras embora, às vezes, escolha girar num compasso diferente do habitual. Aí, então, surgem os poetas propondo pausas que nos desorganizam com uma nova lógica. Acordes dissonantes, silêncios falantes, ausências ansiosas esperando encontros repletos de saudades. Tempo passando, conjugando presente, eternizando-se aos poucos...
     Num breve instante de encanto, o mundo pára e adquire novas nuances quando se adentra pela porta dos  fundos.
      Ela dá acesso à melhor parte da casa. A poesia, à melhor parte de nós.