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domingo, 6 de fevereiro de 2011

Á meia luz de domingo

     Nunca tive a pretensão de entender a razão da minha falta de ar, dessa sensação de náusea existencialista, desse choro contido que nem sequer foi capaz de molhar o travesseiro.
     Não há consolos fáceis capazes de me mover da tristeza de um início de domingo. Aliás, um dia definitivamente repleto de poesia. Os deprimidos sabem muito bem disso. Dia de visita repentina em que a saudade aperta a campainha e se oferece como companhia. Chega soberana, abre a porta, monta a mesa, serve o jantar, escolhe a música e acende o olhar feito lareira. De repente, já é hóspede acomodando-se sem pedir licença.
     Difícil mesmo tem sido suportar esse mundo de pessoas falantes, de sorrisos sempre fartos, sem grandes espantos ou terríveis dilemas para enfrentar. Não há lugar para o silêncio e a solidão nas casas por aí. Ninguém mais suporta o limite de não saber o próximo passo ou a possibilidade de admitir as causas (ou a falta delas) para os apertos do peito.
     Na verdade, o fato é que poucos têm coragem o suficiente para mostrar o coração desprotegido, a aspereza da superfície, os ecos doídos do que é oco, o irremediável tédio diário, o cansaço sem motivos aparentes, os anônimos acontecimentos que nem mereceram um registro fotográfico estampado em algum álbum virtual.
     Mesmo à meia luz do ambiente, a penumbra não esconde a desilusão. A solidão acomoda-se na cadeira enquanto bebe algo mais forte para suportar o amargo da madrugada. Até quis fazer um sambinha bem baixinho como quem morre aos poucos no ato de viver cantando, mas desistiu pela desafinação dos olhos de recriminação dos contentes. Julgou-se cafona e recolheu-se num canto. É que eles estavam “felizes” demais e faziam tanto barulho que até sucumbiram os suspiros tímidos e a rima infante e despretenciosa do poeta aprendiz e tão ensimesmado de dor.     
     Se a poetisa mineira de Divinópolis me permitisse uma licença poética, eu reinventaria os seus versos:

"A uns, Deus quer felizes,
a outros, quer escrevendo".
(Adaptação livre dos versos do poema "Ex-voto", de Adélia Prado)


[A autora tecendo para não entristecer demasiadamente enquanto ouve, pela enésima vez, o álbum “Tua” (2009) de Maria Bethânia]

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