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segunda-feira, 30 de novembro de 2009

Esquecimento

     O que sei de mim por vezes esqueço. Não há vergonha em confessar fraquezas. Só não quero fingir uma força que não possuo. Se possível, sem discurso rebuscado, sem piedade, sem papel de vítima.
     O que sei é que há uma tristeza superior sobrepondo-se às costumeiras. Até meu café anda ficando mais amargo. Nas ladeiras desta cidade, a dor apresenta tintas mais fortes e o choro ainda repete-se monótono pelas mesmas causas de antes.
     Na mesa o jornal apodrece de tanto passado e as plantinhas na porta da cozinha sofrem, murchas e emburradas, pelos descuidos da dona. Ainda há muitos lugares inabitados nessa casa. Difícil reconhecer, mas as luzes acessas não retiram o temor dos passos nem o tremor das mãos.
     As noites ultimamente têm tido cheiro de hortelã, canela ou erva-doce, só não encontrei ainda a razão das tristezas. Apenas sinto que doem com seus aromas estranhos. Inadequação. Quase uma desistência...
     Chás madrugada a fora, poesia em hora inapropriada, água no rosto para esconder o cansaço.
     Na agenda, um bilhete reaparece com uma esquecida frase escrita a quase dois anos atrás. Com letra caprichada, em vermelho vivo: “A vida só pede um pouco de coragem”.
     Lembrei-me do meu primeiro emprego, da carteira assinada, da ousadia em brecar o ritmo, do prazer em narrar histórias para crianças e ver seus olhos fascinados pelo encantado sítio criado por um certo Monteiro Lobato.
     Talvez eu tenha desaprendido a contar histórias.
     Talvez a poesia tenha mesmo desaprendido de mim.